Tomamos a liberdade de reproduzir na íntegra o
editorial do Estadão intitulado "O asceta de Garanhuns", sobre a fala
indecorosa de Lula, ontem, para uma platéia formada na maioria por blogueiros
pagos com dinheiro público -- a única "imprensa" que Lula admite, na
sua visão autoritária, fisiológica e coronelista de poder:
O asceta*
de Garanhuns
21/01/2016 | 02h55
“Se tem uma coisa que eu me
orgulho, neste país, é que não tem uma viva alma mais honesta do que eu. Nem
dentro da Polícia Federal, nem dentro do Ministério Público, nem dentro da
Igreja Católica, nem dentro da Igreja Evangélica. Pode ter igual, mas mais do
que eu, duvido.” Lula continua achando que o brasileiro é idiota. Reuniu ontem
blogueiros amigos para um café da manhã em seu instituto e, a pretexto de
anunciar que vai participar “ativamente” do próximo pleito municipal, aderiu
pessoalmente – já o havia feito por intermédio de seu pau-mandado Rui Falcão –
à campanha promovida por prósperos advogados e seus clientes, apavorados
empresários e figurões da política, para desmoralizar a Operação Lava Jato, que
procura acabar com a impunidade de poderosos corruptos.
Lula conseguiu escapar penalmente ileso do
escândalo do mensalão e, por enquanto, não está oficialmente envolvido nas
investigações sobre o assalto generalizado aos cofres públicos. Os dois casos
juntam-se numa sequência das ações criminosas que levaram dinheiro sujo para os
cofres do PT e aliados e “guerreiros” petistas como José Dirceu, José Genoino e
Delúbio Soares para a cadeia.
O que é inacreditável é que, como presidente da
República e dono do PT, Lula não tivesse conhecimento do mensalão e do petrolão
que desfilavam sob seu nariz. Assim, é notável o atrevimento – talvez mais
estimulado pelo desespero do que por sua índole de ilusionista – com que o
personagem, que ficou rico na política, se apresenta como monopolista das mais
prístinas virtudes.
Só mesmo alguém empolgado pelo som da própria voz e
pelas reações da platéia amiga cairia no ridículo de se colocar como referência
máxima e insuperável em matéria de honestidade. “Pode ter igual, mas mais do
que eu, duvido.”
Apesar de inebriado com as próprias virtudes, Lula
encontrou espaço para a modéstia – infelizmente de braços dados com a
mendacidade, que alguns chamam de exagero retórico – ao se referir ao combate à
corrupção. Fez questão de dar crédito a sua sucessora, deixando no ar a
pergunta sobre a razão pela qual os petistas esperaram oito anos, até que o
chefão deixasse a Presidência, para se preocuparem com os corruptos: “O governo
criou mecanismos para que nada fosse jogado embaixo do tapete nesse país. A
presidente Dilma ainda será enaltecida pelas condições criadas para punir quem
não andar na linha nesse país”. E arrematou, falando sério: “A apuração da
corrupção é um bem nesse país”.
Lula não se conforma, no entanto, com a mania que
os policiais e procuradores têm de o perseguirem, obstinados pela absurda ideia
fixa de que ele tem alguma coisa a ver com a corrupção que anda solta por aí:
“Já ouvi que delação premiada tem que ter o nome do Lula, senão não adianta”.
Ou seja, os homens da Lava Jato ou da Zelotes não vão sossegar enquanto não
obrigarem alguém a apontar o dedo para o impoluto Lula. Mas, confiante, o
chefão do PT garante que não tem o que temer: “Duvido que tenha um promotor,
delegado, empresário que tenha coragem de afirmar que eu me envolvi em algo
ilícito”.
Lula falou também sobre a fase mais financeiramente
próspera de sua carreira política, quando, depois de ter deixado o governo, na
condição de ex-presidente faturou alto com palestras aqui e no exterior
patrocinadas por grandes empresas. Explicou que é comum ex-chefes de governo
serem contratados para transmitir suas experiências ao mundo. Quanto a
palestrar no exterior para levantar a bola de empreiteiras que para isso lhe
pagam regiamente, Lula tem a explicação que só os mal-intencionados se recusam
a aceitar: “As pessoas deveriam me agradecer. O papel de qualquer presidente é
vender os serviços do seu país. Essa é a coisa mais normal em um país”.
De fato, é muito louvável que um ex-presidente da
República se valha de seu prestígio para “vender” os serviços e produtos de grandes
empresas brasileiras aptas a competir no mercado internacional. Resta definir
quando essa benemerência se transforma em tráfico de influência.
“Nesse país”, porém, qualquer um que manifeste
dúvidas em relação à absoluta integridade moral do asceta de Garanhuns é insano
ou mal-intencionado.”
*Asceta – ermitão, líder religioso de fanáticos.
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