É Câmara ou templo evangélico?
Quem comparece ao prédio da Câmara Municipal de Araçatuba, durante as sessões legislativas, menos avisado, pode achar que entrou no local errado, entrou num templo evangélico. Parece que alguns vereadores não conseguem separar suas vocações e ideais religiosos de seus afazeres e obrigações públicas. A Câmara de Araçatuba não produz, não rende. A pauta vive lotada de assuntos, projetos e requerimentos que não são votados, discutidos graças a este envolvimento, essa mistura de temas religiosos-sectários, com os assuntos públicos. O presidente da edilidade que é professor universitário de Direito, deveria ser o primeiro, a saber, e pôr em prática a condição da laicidade do Estado, ou seja, somos e vivemos num país laico onde não deveria, por preceito constitucional e fundamental haver esse exagero de exposição e envolvimento com assuntos religiosos durante a realização das sessões legislativas. Para inicio de conversa, os vereadores deveriam retirar o enorme crucifixo pendurado na parede do plenário e extirpar dos procedimentos internos a leitura desnecessária e hipócrita de trechos da Bíblia. É um hábito “imposto” por vereadores ligados a igrejas evangélicas, cujo interesse nisso tudo é meramente usar um espaço público para agradar esta ou aquela denominação religiosa em troca de votos. Estive na Câmara nesta última semana e, durante a leitura do trecho bíblico, mantive-me sentado contrariando a praxe de se levantar e dizer em coro o amém!
Desrespeito? Podem entender que sim, mas desrespeito praticam os vereadores com esse ritual litúrgico misturado com as atividades político-públicas que acabam sendo prejudicadas e muitos projetos e requerimentos de elevado interesse público acabam sendo preteridos, adiados por conta dessa ingerência desnecessária, absurda e inconveniente de temas religiosos, notadamente evangélicos, levados ao plenário, notadamente pelo vereador Dr. Nava que sustenta-se politicamente em diversas congregações religiosas e faz da tribuna da Câmara, palco espetacular das iniciativas por parte dessas seitas. Será que isso interessa ao grande público, ao eleitor? Será que o povo vota em vereador para ficar louvando e anunciando as “maravilhas” religiosas de sua fé pessoal? A quem interessa saber se o vereador é católico, evangélico, budista, espírita, umbandista, etc? Cada vereador custa para os cidadãos de Araçatuba, um bocado de milhões de Reais e o vereador foi eleito para defender, representar o povo e não esta ou aquela denominação religiosa! É um absurdo o tempo perdido em discussões inócuas, inférteis com votos de aplausos, votos de pesar. Quem interessa saber que o Dr. Nava foi “excelente” zagueiro em sua mocidade?!!! Ou que se levantava cedo para levar seu filho para jogar futebol?!!! E o relógio andando e nada de se discutir assuntos de interesse público! Para completar, o “brilhante” vereador Batata apresenta um Voto de Aplausos para um guarda municipal que separou uma briga na rua, salvando uma mulher de seu agressor! Será que o vereador Batata não sabe que esta é uma obrigação rotineira de um agente público de segurança?!! Se a cada ação de um guarda municipal a Câmara dar um Voto de Aplauso, aonde vamos parar?!!! Haja estupidez, haja paciência, haja saco para aguentar essas “Excelências”!!!
A Constituição Federal é clara e taxativa em seu artigo 19 quando diz textualmente: “É vedado (proibido) à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municipios:
I – Estabelecer cultos religiosos ou igrejas, subvencioná-los, embaraçar-lhes o funcionamento ou manter com eles ou seus representantes relações de dependência ou aliança, ressalvada, na forma da lei, a colaboração de interesse público”.
Será que os vereadores já leram a Constituição, em especial este artigo?! Para bom entendedor – “manter com eles ou seus representantes relações de dependência ou aliança...” Ou seja, os vereadores descumprem a Constituição com suas práticas ofensivas ao Estado laico. O vereador Dr. Nava antes defendia com unhas e dentes e fazia parte da base de apoio ao prefeito Cido Sério. De repente, se voltou contra o alcaide e vota com a oposição agora. E por quê? Porque o prefeito não quis “engolir” um pastor evangélico como vice em sua chapa, indicação do Dr. Nava que faz da Câmara, um prolongamento de suas atividades religiosas. Virou uma farra, um carnaval esse casamento incestuoso entre políticos e pastores evangélicos que até indicam ocupantes em cargos de confiança no gabinete municipal. É entrega de chave de Cristo prá lá, é orações prá cá, numa perigosa e nociva relação entre a “res pública” o profano e o santo, se é que existe alguma santidade nesse fervor religioso que se transformou o plenário da edilidade. É preciso que alguém tenha a coragem de pôr um fim nesse sacrilégio, nessa blasfêmia toda. A atividade parlamentar diz respeito a atos públicos, à administração pública. Que cada um siga sua religião da forma como quiser, respeitando o direito constitucional do outro, inclusive daqueles que não seguem nenhuma seita ou religião. O que se vivencia nos dias de hoje na Câmara de Araçatuba é um espetáculo deprimente, desnecessário, inútil, numa vã tentativa de usar os instrumentos do Estado para cooptar, para aliciar pessoas e mostrar algo que deveria ser privado, íntimo.
Tramita no Congresso Nacional, um projeto de iniciativa de um desses deputadozinhos desprezíveis, o mesmo que apresentou o famigerado projeto da tal “cura gay”, é um pseudo-pastor evangélico que quer dar espaço para que igrejas possam questionar no Supremo Tribunal Federal, a constitucionalidade das leis!!! Só faltava isso!!! Só falta essa iniciativa espúria, imunda, inadequada de se dar oportunidade para que elementos perniciosos, malignos, psicopatas como Marcos Feliciano, possam subir ao Olimpo das leis, o STF e questionarem esta ou aquela lei. Essa tal bancada evangélica, xiita, com idéias medievais, composta por gente da pior espécie, por gente ignorante que não respeitam o direito de outrem, não respeitam as liberdades individuais, no fundo, querem incendiar este país. É preciso sensatez, é preciso equilíbrio e respeitar-se o Estado laico que vivemos. A Câmara de Araçatuba deve abandonar essas sessões de pura bajulação, rasgação de seda e essa tentativa inconstitucional de se usar um espaço público para fins sectários ou religiosos. Os vereadores precisam trabalhar, são pagos para isso e não ficarem bajulando este ou aquele pastor, esta ou aquela igreja. O próprio Cristo ensinou a laicidade: “Dai a Cesar ou que é de Cesar”.
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